A maioria de nós tem tido profundas “experiências” – ou que outro nome lhes queirais dar – temos tido inspirações portadoras de êxtase sublime, de visões grandiosas, de intenso amor. Essas “experiências” nos invadem com a sua luz e alento; mas não perduram: passam, deixando o seu perfume.
Acontece com a maioria de nós que a mente-coração não é capaz de permanecer aberta para tal êxtase. A “inspiração” é acidental, não provocada, grande demais para a nossa mente-coração. A inspiração é maior do que aquele que a experimenta, e por isso procura ele abaixá-la ao seu próprio nível, à órbita de sua compreensão. Sua mente não está tranqüila; está ativa, rumorosa, reordenando; tem de ocupar-se de alguma maneira com aquela inspiração; tem de organizá-la, divulgá-la, comunicar a outros a sua beleza. Reduz, por essa maneira, a mente o inexpressível a um padrão de autoridade ou regra de conduta; interpreta e traduz a “experiência”, envolvendo-a, assim, na sua própria trivialidade. Por não saber cantar, a mente-coração persegue o cantor.
O intérprete, o tradutor da inspiração, deve ser tão profundo e vasto quanto ela, se a deseja compreender; não o sendo, deve desistir de interpretá-la, e para desistir ele precisa de estar maduro, de ser judicioso, na sua compreensão. Podeis ter uma “experiência” significativa, mas como a compreendeis, como a interpretais, depende de vós, o seu intérprete; se vossa mente-coração é limitada, acanhada, traduzis a experiência, então, conforme esse condicionamento. O condicionamento é que deve ser compreendido e desfeito, para que possais apreender o pleno significado da “experiência”.
A madureza da mente-coração advém quando ela se liberta de suas próprias limitações e não quando se apega à lembrança de uma “experiência” espiritual. Se se apega à memória, então ela habita com a morte e não com a vida. Uma experiência profunda pode abrir a porta para a compreensão, para o autoconhecimento e o reto pensar, mas, para muitas pessoas ela se torna apenas um estímulo agitante, uma lembrança, perdendo logo o seu significado vital, e impedindo a continuação da “experiência”.
Interpretamos toda inspiração em termos de nosso próprio condicionamento. Quanto mais profunda é a inspiração, tanto mais vigilantes devemos estar para a não interpretarmos erroneamente. São raras as inspirações profundas e espirituais, e quando as temos, nós as rebaixamos ao nível rasteiro de nossa própria mente-coração. Se sois cristão, ou hinduísta, ou incrédulo, traduzis a inspiração de maneira correspondente, abaixando-a ao nível de vosso condicionamento. Se vossa mente-coração é dada ao nacionalismo e à cupidez, à paixão e à malevolência, será, nesse caso, a inspiração utilizada para fomentar a matança de vossos semelhantes; vós a tomais então por guia para bombardeardes vosso irmão; adorar será então destruir ou torturar os que não são vossos compatriotas ou correligionários.
É essencial que estejais cônscios de vosso condicionamento, em vez de procurardes “ocupar-vos” de uma experiência passada; mas a mente-coração apega-se a tais experiências, ficando assim incapacitada para compreender o presente vivo.
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